domingo, 4 de dezembro de 2011

Bullying e Ciberbullying

Por Sriman Gopala Prabhu

“Alguns tipos de bullying e cyberbullying mais freqüentes atualmente na ISKCON:

Religião

Bem, o primeiro conflito mais gritante, que não precisa procurar muito para ver que há em qualquer yatra ou grupo vaisnava virtual da ISKCON, é o conflito de religião. Sim, isso mesmo: de religião. Enquanto o devoto não entende muito bem o que é consciência de Krishna, ele tende a se apegar aos aspectos externos do Movimento Hare Krishna, vê a ISKCON como uma religião hindu, e tenta transformar todos os visitantes e simpatizantes em hinduístas. Agora mesmo, estamos para entrar em dezembro, e é comum nessa época alguns devotos lançarem uma série de críticas, grande parte despropositais e descabidas, aos devotos cristãos, na tentativa de intimidar e coibir manifestações cristãs dos devotos que mantêm laços afetivos com essa religião - mesmo que estas manifestações sejam védicas, amorosas (bhakti-yoga) e favoráveis à consciência de Krishna do manifestante. Tais devotos bullies anti-cristãos não estão em paz consigo mesmos, e trazem esse seu conflito interno para dentro da ISKCON, e tentam transformar, a força e coerção, os devotos da ISKCON em ativistas anti-cristãos. Quando esse comportamento valentão se mostra constante, temos aí uma situação de bullying ou cyberbullying na ISKCON. A vítima é, por exemplo, um devoto que desejou um feliz natal para os outros, o agressor bullie é aquele que, a partir daí, passa semanas esculhambando com o natal dos cristãos, e os espectadores somos todos nós que aceitamos calados a esculhambação, ou apoiamos as manifestações esculhambadoras contra os devotos de outras linhas filosófico-religiosas - apesar de Srila Prabhupada dizer que Jesus Cristo é um devoto puro, e Srila Bhaktivinoda afirmar que os cristãos são devotos. Esse bullying normalmente ocorre entre devotos neófitos materialistas versus curiosos, amigos e simpatizantes da ISKCON.

Casta

Outro conflito bastante freqüente é o conflito de casta indiana na ISKCON. Não é o conflito de varnasrama (desse falaremos mais adiante). Estamos falando de conflito de casta indiana. A diferença entre varnasrama e casta é que no varnasrama as posições sociais são reconhecidas e respeitadas com base nas qualidades, talentos naturais e treinamento da pessoa. Nas castas indianas, o reconhecimento social é baseado no título de nascimento, mesmo que a pessoa não demonstre possuir as qualidades necessárias à execução da atividade, ou nem mesmo execute a atividade de modo algum. De forma semelhante, muitos devotos assumiram funções no passado devido ao segundo nascimento (iniciação espiritual), mas depois abandonaram o serviço devocional (dever prescrito). Mas, agora querem, às vezes décadas depois, continuar sendo reconhecidos, respeitados e, principalmente, obedecidos, com base em um título ao qual não fazem mais jus há muitos anos. Ou seja: abandonaram o daiva-varnasrama da ISKCON e trocaram-no, em suas cabeças, por um asura-varnasrama baseado em vaidade e "falso-ego de devoto". E, mesmo quando gentilmente convidados a retomar seu serviço devocional abandonado, ou mesmo qualquer outro serviço devocional, não retomam nenhum serviço prático na ISKCON, e ainda se sentem desrespeitados por não serem obedecidos ou, mesmo, não serem satisfeitos em suas exigências para com a ISKCON. Quando tais conflitos devido à exigência de respeitos, obediências e "compensações", baseados em vazios "títulos de nobreza", continuam por meses e anos, podemos ter aí um outro caso de bullying ou cyberbullying na ISKCON. Esse bullying normalmente se dá entre devotos "antigos" versus autoridades espirituais e administrativas da ISKCON.

Roupa

Um conflito bastante comum na ISKCON se dá entre aqueles que têm o estereótipo da ISKCON (dhoti, kurta, sari, tilaka, sikha, kanti,mala japa, karatalas, mridangas, incensos, e afins) como um sinal de avanço espiritual e prestígio social, e aqueles que querem zelar pela tradição e respeitabilidade de tais indumentárias, decorações e utilitários de serviço devocional. Então, temos aqueles que, por exemplo, querem usar dhoti, mesmo não sendo monges, porque se não usarem não conseguem ver a si mesmos como devotos, versus aqueles que não querem deixar que dhoti seja usado por qualquer um porque, segundo eles, essas são roupas sagradas destinadas aos monges seriamente engajados na ISKCON. Inversamente, têm aqueles que não querem usar dhoti, mas se sentem constrangidos por certos membros da congregação a usar o dhoti, ou não serão vistos e aceitos por esses membros como devotos sérios. Quando tais conflitos por indumentária, ornamentos, adereços e parafernália externa prossegue, forte e seriamente, por meses e anos, sem sinal de solução à vista para as partes que se sentem pressionadas, injustiçadas ou insatisfeitas (e, nesse caso, como todos podem se sentir satisfeitos, se estão cultivando uma consciência da roupa, e não consciência de Krishna?), então podemos ter outro caso de bullying e cyberbullying na ISKCON. Este bullying normalmente acontece entre devotos ditos "conservadores" versus devotos ditos "liberais" da ISKCON.

Comida

Outro conflito bastante freqüente na ISKCON é pelo controle do que o outro come ou deixa de comer. Há aqueles que se atêm a não comer carne, peixe e ovos, e há aqueles que também não comem enlatados, ou também não bebem refrigerante, ou também não comem nada industrializado, ou também não comem nada com açúcar, ou também não comem nada cozido (só cru), ou que só comem frutas e bebem leite, ou, ainda, só tomam leite e comem queijo se forem da procedência x ou y, ou também não consomem nenhum tipo de laticínio de jeito nenhum, ou... enfim, entre o que segue apenas o voto feito na iniciação, e aquele que vive praticamente só de prana (respiração), há uma imensa gama de devotos e devotas, que se aglutinam em diferentes grupos por afinidade, e trocam dicas de onde encontrar os alimentos mais saudáveis que aceitam (Opa! Que oferecem com amor e devoção a Krishna :-) . Quando, por qualquer motivo, um devoto ou grupo se torna ativista da sua opção de alimentação, e tenta, por meios constrangedores, iracundos ou desrespeitosos, fazer ver que todos os outros devotos são uns caídos, inconscientes, ou violentos em sua alimentação, menos eles mesmos que são iluminados e sabem "pacificamente" o que comer e não comer, e tais constrangimentos e vexames seguem por dias, semanas e meses, sem que os ânimos apazigüem, podemos ter aí um dos mais comuns bullyings ou cyberbullyings na ISKCON. Normalmente, tais bullyings se dão entre devotos da ISKCON cuidadosos com a alimentação versus devotos da ISKCON que já estão dando graças a Deus só por terem conseguido parar de comer carne, apesar de toda a família ao redor da sua mesa estar mastigando bifes, galinhas e omeletes.

Sexo

Outro conflito sempre presente é sobre a opção e freqüência sexual dos outros. Isso mesmo: o devoto(a) fica cuidando pessoalmente da sexualidade de Fulano, Beltrano ou Sicrana. É que, por mais absurdo que possa parecer, certos devotos, ao invés de cuidarem dos seus próprios votos de iniciação, ficam cuidando dos votos (ou não votos) dos outros. E alguns se sentem especialmente muito incomodados caso algum devoto ou devota da congregação não se encaixe nos rígidos padrões sexuais zelados por ele, e se põem logo em um bullying, direto, indireto ou virtual, contra os devotos gays, contra as devotas lésbicas, contra devotos(as) transsexuais... A ideia desses zelosos "guardiões públicos" da sexualidade alheia é "varrer" para longe da ISKCON quem não tiver os mesmos padrões sexuais defendidos por eles. Como resposta, os devotos homossexuais ou fora dos "padrões" de sexualidade se põem em um forte bullying reverso, fundando associações GLBT vaishnavas e através delas esculhambando com os devotos heterosexuais da ISKCON. Curiosamente, nenhum dos grupos aprendeu esse tipo de comportamento vexatório com Srila Prabhupada, que tinha até um discípulo transsexual. Historicamente, esse puritanismo sexual teve início na Inglaterra do período vitoriano (aproximadamente, de 1837 a 1901), e tratava-se mais de negação, preconceito, elitismo e hipocrisia, do que de real esclarecimento e auto-controle dos desejos sexuais. Devido às conquistas coloniais inglesas da época, tais padrões se espalharam pelo mundo. Já o período de liberação sexual foi marcado pela negação da negação, começando com os estudos de Freud sobre libido e psico-sexualidade, e eclodindo como conflito revolucionário sexual nas décadas de 1960 e 1970, devido a exploração comercial da tendência contestadora e crítica dos hippies. Curiosamente, antes dessa confusão histórica toda, as pessoas homossexuais estavam, como sempre estiveram, e ainda estão, inseridas na sociedade humana, inclusive servindo nas cortes de reis e rainhas dos mais santos. Então, os bullyings relacionados a sexualidade na ISKCON não se dão normalmente entre seguidores de Srila Prabhupada, mas sim entre seguidores da rainha Vitória da antiga Inglaterra do século 19 versus seguidores do psicanalista Freud do antigo Império Austríaco do século 20.

Formas de combater o bullying e cyberbullying incluem: esclarecimentos abertos e freqüentes aos membros dos grupos estudantis, familiares, profissionais, sociais e outros; promoção de discussões e debates sobre as formas de atuação e conseqüências das ações dos agressores; modos como os grupos podem estar atentos e vigilantes quanto a possíveis casos de bullying e cyberbullying em seu meio; como levar os casos ao conhecimento de professores, diretores, pais, chefes, etc.; e formas como tais autoridades podem tratar eficazmente os casos reconhecidos, descobertos ou denunciados.

Dezembro - 2011