sexta-feira, 13 de março de 2009

Compreendendo os Passatempos do Senhor

Krsna Deixa Vrndavana em Algum Momento?

SS Romapada Swami

Krsna jamais dá sequer um passo para fora de Vrndavana.. As manifestações de Krsna fora de Vrndavana – em Mathura, Dvaraka, etc. – são expansões plenárias de Krsna.

Entende-se que o Krsna que aparece em Mathura como o filho de Devaki é Vasudeva Krsna, uma das quatro expansões “catur-vyuha”. (A primeira expansão de Krsna é Balarama, que expande-Se, então, no catur-vyuha, a saber, Vasudeva, Sankarsana, Pradyumna e Aniruddha. Do catur-vyuha, emanam todas as demais expansões).

Nossos acaryas explicam que este Vasudeva Krsna fundiu-Se transcendentalmente então no corpo de Yasoda-nandana Krsna quando Vasudeva O levou para Vrndavana na calada da noite. Mesmo dentro de Vrndavana, os passatempos envolvendo a morte de demônios não foram realizados por “svayam-bhagavan” Krsna, mas por essa expansão Vasudeva Krsna.

Quando Krsna aparentemente parte para Mathura com Akrura, foi Vasudeva Krsna quem partiu, enquanto que “svayam bhagavan” Krsna entrou no Yamuna e no coração de todos os residentes de Vrndavana e permaneceu ali imperceptível, enquanto os Vrajavasis desfrutavam de Sua associação no mais elevado êxtase de amor em separação e saudade.
A narração geral que encontramos é que Krsna jamais realizou o passatempo de retornar de Dvaraka para Vrndavana.


No entanto, a seleção de citações que se seguem do Sankalpa Kalpa-druma de Srila Jiva Gosvami apontam as referências escriturais que indicam o contrário. Outros de nossos acaryas Vaisnavas indicam uma conclusão similar, novamente com base em referências escriturais de igual autoridade. Você encontrará uma de tais referências no significado da BBT ao SB 10.78.16, o qual indica claramente, com referência ao Padma Purana, que Krsna entrou em Vrndavana após matar Dantavakra.

Além disso, os residentes de Vrndavana tiveram a oportunidade de se encontrar com Ele durante o eclipse solar em Kuruksetra. Nesse contexto, as gopis, sendo incapazes de suportar a visão de Krsna em vestes reais e rodeado por toda a parafernália da realeza, desejaram levá-lO de volta às florestas de Vrndavana. Nesse humor, elas começaram a puxar Seu carro. O Ratha-yatra significa este empenho das gopis em levar Krsna de volta a Vrndavana.

SANKALPA KALPA-DRUMA, DE SRILA JIVA GOSVAMI: PARTE UM
Capítulo Um: Janmadi Lila. O Nascimento do Senhor Krsna e Outros Passatempos
12. Sri Krsna, o filho de Nanda, que, embora esconda-Se dos rituais Védicos e não apareça nos mantras Védicos, aparece alegremente diante de algumas pessoas neste mundo. ...
226. ...que retornou a Vraja, como as pessoas de Dvaraka explicam na oração registrada no SB 1.11.9, a saber, “Ó Senhor de olhos de lótus, sempre que Você vai a Mathura, Vrndavana ou Hastinapura para Se encontrar com Seus amigos e parentes, cada instante de Sua ausência assemelha-se a um milhão de anos. Ó infalível, nesse momento, nossos olhos tornam-se inúteis, como se privados do sol”.
227. ...que concede Sua presença auspiciosa às pessoas de Vraja eternamente, como é descrito no Padma Purana, Uttara Khanda. ...
228. ...que, permanecendo em Vraja, assumiu outra forma e foi a Dvaraka, sendo tal ação claramente registrada nas escrituras. ...
229. ...sobre quem Uddhava disse: “Krsna irá, muito em breve, retornar a Vraja” (SB 10.46.34), que tem, portanto, de ter retornado a Vraja, pois, de outra forma, Uddhava teria dito uma mentira. ...
257. ...que disse no Brhad Gautamiya Tantra: “Eu, a Suprema Personalidade de Deus, o mestre de todos os semideuses, jamais deixo a floresta de Vrndavana”...
258. ...que disse no Brhad Gautamiya Tantra: “Milênio após milênio, apareço em Vrndavana e então novamente desapareço; Vrndavana não pode ser vista com olhos materiais”. ...
260. ...cujas palavras “jamais deixo Vrndavana” podem ser interpretadas de duas maneiras: tanto “Eu estou sempre presente em Vrndavana, mesmo quando parece que parti”, ou “Se, de alguma forma, deixo Vrndavana, sempre retorno rapidamente”...
261. ...que eternamente permanece em Suas duas cidades (Mathura e Dvaraka), como o SB 10.1.28 explica: “A cidade e o distrito de Mathura são muito intimamente conectados com Krsna, pois o Senhor Krsna reside ali eternamente”.
266. Krsna matou Dantavakra na via pública, e, então, retornou a Vraja para ali viver. O rei Nanda e os demais habitantes de Vraja foram até Ele como pássaros cakora a contemplarem famintos a lua.
267. Vendo que Seu pai e os habitantes de Vraja estavam secos e enfraquecidos em razão do tempo que passaram sem O ver, o Senhor Krsna espirrou sobre eles o néctar de Sua presença. Fingindo estarem de pé com os pêlos do corpo arrepiados, as árvores, que eram os vaqueiros, repetidamente faziam brotar rebentos de felicidade.
268. Então, o Senhor Krsna, exibindo as mesmas características de antes, aproximou-Se das gopis, elas cujos olhos assemelham-se aos olhos das corças. Questionando-se mentalmente se o Senhor Krsna realmente encontrava-Se diante delas, as gopis ficavam confusas, não confusas, e então confusas novamente – instante após instante.
269. Enquanto Ele entrava em Vraja, as pessoas Lhe ofereciam aratik com muitas jóias, derramavam flores sobre Ele, exclamavam “Jaya! Jaya!” e O saudavam com palavras auspiciosas.
270. Aprazendo-os com palavras graciosas e humildes, o Senhor Krsna deu Sua associação aos habitantes de Vraja. Então, para banhar Sua mãe em felicidade, Ele rapidamente entrou em Sua casa.
271. Por um longo tempo, Ele a satisfez. Então, com a permissão dela, Ele deitou-Se em uma cama esplêndida, e, rodeado por todos os Seus amigos, dormiu à noite.
272. Levantando-Se da cama, o glorioso Krsna levou grande alegria a Seus amigos eternos. Com Seu rosto de lótus desabrochando em felicidade, Ele deu início a um grande festival de néctar para os olho de Seus amigos, olhos estes similares a abelhões.
273. A cada dia, os habitantes de Vraja amavam Krsna com um amor maior do que antes. A cada dia, eles viam que a beleza de Krsna era maior do que Sua beleza vista anteriormente.
274. Ansioso por ver o Rei Nanda após alguns dias, o Senhor Krsna pegou Rohini, Uddhava e muitos outros e rapidamente foi de quadriga para Vraja.
275. A deusa Yogamaya criou uma forma de Deidade de Krsna, e as gopis, cujos olhos são belíssimos, e que ansiavam por se casar com Krsna, adoraram essa Deidade com o mel de seu amor ardente.
276. Quando o Senhor Krsna assumiu uma forma diferente e foi para a cidade dos Yadavas, Sua forma original ficou visível apenas para as pessoas na gloriosa vila de Vraja. Ó mente, por favor, sempre pense nessa forma do vaqueirinho Krsna.


Krsna Aconselhando Arjuna a Matar Karna

Se Krsna escolhe enganar alguém, ninguém pode superá-lO em termos de enganação. Como Srila Prabhupada comenta, a grandeza de Krsna não é unilateral – Ele pode ser o maior dos enganadores quando Ele assim decidir. Sua enganação, contudo, também é a justiça mais elevada.

Krsna arranja para que aquele que engana outros seja enganado também. Esta foi uma das lições que Ele desejou mostrar através do episódio mencionado: aqueles que adotam meios fraudulentos também merecem ser mortos por meios fraudulentos.

Desde o começo, Karna, juntamente com Duryodhana e seus comparsas, envolveu-se em todos os esquemas iníquos que objetivavam aniquilar os Pandavas – começando com a destruição do palácio de laca, o traiçoeiro jogo de dados e a tentativa de insultar Draupadi. Mesmo durante a batalha de Kuruksetra, Karna, Dronacarya e outros haviam se unido para dolosamente matar Abhimanyu.

Conhecendo bem a falta de escrúpulos e a característica desconsideração pelos códigos de honra e cavalheirismo dentro do grupo de Duryodhana, os Pandavas, ao princípio da batalha, estabeleceram uma condição à estipulação das regras da batalha.

Eles disseram que eles não seriam os primeiros a quebrar as regras estabelecidas para o combate, mas, se os Kauravas adotassem meios tortuosos e injustos, então eles também se valeriam de qualquer tática que julgassem apropriada. Desta maneira, quando Abhimanyu foi morto por meios injustos, Krsna arranjou para que aqueles envolvidos em tal ato injusto também encontrassem seu fim por meios similares.

Quando a quadriga de Karna se emperrou em função da maldição de um brahmana, e ele solicitou a Arjuna que desistisse de lutar em nome do princípio da virtude, o Senhor Krsna lembrou a karna explicitamente que ele não merecia uma luta justa, e, desta sorte, instigou Arjuna a matá-lo imediatamente.

O Senhor Krsna Foi Infiel a Srimati Radharani Casando-Se com Rukmini devi?

O ato de Krsna deixar Vrndavana e todos os Seus amados associados lá não foi um ato de infidelidade; ao contrário, é um ato de profunda importância espiritual. Você talvez já tenha ouvido dizer que a Suprema Personalidade de Deus cumpre vários propósitos através de uma ação.

A razão externa para Krsna deixar Vrndavana foi atender outros compromissos, como matar os demônios e estabelecer princípios religiosos (como Ele prometera à Mãe Terra antes de Seu aparecimento, e que cumpriu na batalha de Kuruksetra) bem como reciprocar com Seus outros devotos de Mathura e Hastinapura.

No entanto, a razão interna foi Seu desejo por reciprocar o incomparável amor dos residentes de Vrndavana. Krsna, na verdade, jamais deixar Vrndavana – esta é a declaração das escrituras. Ao contrário, Ele permaneceu com as gopis e com Mãe Yasoda em Sua expansão de bhava, e aparentemente em separação apenas com o propósito de aumentar o amor extático que elas dedicam a Ele. (Cf. Krsna Book, Cap. 11)

Krsna explica isto em Sua mensagem mediada por Uddhava: “Minhas queridas gopis, a fim de ampliar o sobresselente amor que vocês dedicam a Mim, Eu propositalmente Me separei de vocês. Eu fiz isso para que vocês pudessem meditar constantemente em Mim”. (Cf. Krsna book, Cap. 12)

As gopis auferiram um nível tão intenso de amor a Krsna que Krsna sentiu-Se incapaz de recompensá-las; Ele explicaria posteriormente que a única maneira que Ele encontrou para aumentar a felicidade transcendental delas foi fazendo-as servirem-nO em saudade.
Este método de amor e serviço no humor de separação é a forma mais elevada de absorção em Krsna e a fonte mais elevada de êxtase espiritual – e este fato é muito difícil de se compreender do ponto de análise material.


O próprio Krsna, enquanto em Dvaraka, estava constantemente absorto neste humor amoroso de separação e saudade de Radharani.

Seu casamento com Rukmini e outras rainhas não deve ser visto da plataforma mundana. Rukmini e todas as demais rainhas de Dvaraka são, na verdade, expansões de Srimati Radharani, e são a energia espiritual interna do Senhor.

Não há nada imoral, infiel ou reprovável nos divinos passatempos do Senhor Supremo – todos eles têm a finalidade de simplesmente aumentar a felicidade espiritual de Seus devotos.

Sita Devi

Com relação ao seqüestro/toque de Mãe Sita realizado por Ravana, Srila Prabhupada freqüentemente explica que Ravana não poderia capturar realmente Sita, mas apenas maya-Sita, o que também aparece na discussão do Senhor Caitanya com Ramadasa Vipra no Cc. Madhya (9.178-212).

Também se dá a entender a partir da descrição no Caitanya-Caritamrta que isto era sabido apenas por Mãe Sita ou talvez apenas por Ela e pelo Senhor Rama.
Se foi maya-Sita que foi raptada, e maya-Sita era uma pessoa diferente da verdadeira Mãe Sita, como entendemos os passatempos no restante do Ramayana?


Isso parece tornar os sentimentos de separação do Senhor Rama e Seu colossal empenho por obtê-lA de volta como atos teatrais. Isso também parece tornar os sentimentos de separação e devoção de Mãe Sita em Lanka algo inaplicável.
O fato do Senhor Krsna ficar com medo de Mãe Yasoda, por exemplo, é descrito pela Rainha Kunti como algo muito difícil de se compreender em razão do medo personificado temer Krsna, e o Senhor não está apenas atuando, senão que está realmente com medo. O Senhor Rama mantém uma atuação muito embora Ele “saiba” que a verdadeira Sitadevi não foi raptada? Em um sentido, toda a lila do Senhor Supremo poderia ser chamada de “atuação para o prazer de Seus devotos”, dado que, em última instância, o Senhor Krsna ou o Senhor Rama conhecem tudo? (Digest 124.1)


Os passatempos do Senhor Supremo são atuados sob a influência de yoga-maya, a potência interna do Senhor. Embora o Senhor Krsna ou Rama seja onisciente; sob a influência de yoga-maya, Ele torna-Se “deslembrado”, ou comete ditos “erros” ou apresenta-Se aparentemente ignorante dos verdadeiros fatos. Ele não está apenas atuando “como se estivesse” com medo de Mãe Yasoda, ou “como se estivesse” tomado de lamentação em conseqüência da perda de Sita. Ele está realmente experimentando o humor de uma criança dependente ou de um amante que perde sua amada.

Algumas vezes, absorto em pensamentos acerca de Srimati Radharani, Krsna tenta ordenhar um touro! Ele não está fingindo, senão que de fato comete tais erros sob a influência de yoga-maya. Isto não interfere, entretanto, em Sua capacidade de onisciência. Yoga-maya é Sua energia pessoal, sempre subserviente a Ele, mas Ele voluntariamente Se coloca sob a influência dela a fim de desfrutar de Seus passatempos.

No concernente a Sita, o fato de que era apenas uma forma ilusória aquela da qual se apoderou Ravana e levou para Lanka não interfere no profundo sentimento de separação sentido por Mãe Sita. Ela estava experimentando verdadeiramente o êxtase do amor em separação, e Sua réplica-sombra, maya-Sita, também exibia sentimentos similares em Lanka.

Quase que à parte do desenrolar de eventos que levaram à destruição de Ravana e ao estabelecimento da vitória da virtude sobre o mal; em outra dimensão, todo esse passatempo foi orquestrado de tal forma a intensificar o amor em separação entre Rama e Sita, um tanto similarmente aos eventos que levaram à partida de Krsna de Vrndavana.

Como Sitadevi pode ser considerada poluída/poluível (como por Ramadasa Vipra, por exemplo), em função do toque de Ravana, o que aconteceu muito contra a vontade dEla, e muito embora Sitadevi seja eternamente pura, visto ser Maha-Laksmi? De acordo com o sistema Védico, uma mulher é considerada materialmente poluída pela sociedade em razão de um simples toque ou de uma pequena molestação por parte de outra pessoa contra a sua vontade? Ela talvez se considere poluída, mas a sociedade também a considera dessa forma? (Se ela toca ou é tocada desejosamente por outra pessoa de alguma maneira, é claro que ela é definitivamente poluída).

O Senhor Rama consistentemente disse saber que Sitadevi é pura. No entanto, como um governante ideal, Ele estava preocupado com a opinião do público em geral, em conseqüência do que Ele A levou para tomar um banho de fogo e também A enviou para a floresta. (Digest 124.1)

Na cultura Védica, grande importância era atribuída à pureza e à castidade das mulheres, e a mesma importância era dada à proteção delas. Srila Prabhupada comentava que, se acontecia de uma moça ficar fora de casa, mesmo que pela duração de uma noite, sem estar acompanhada por seu pai ou esposo, seu caráter seria colocado em dúvida, e isso era, do ponto de vista social, completamente inaceitável. Essencialmente, tais severidades e restrições eram estabelecidas com o intento de proteger as mulheres de situações indesejáveis ou abusos, e era igualmente a responsabilidade de seus guardiões oferecerem a elas tal proteção, daí Rama ter reprovado a Si mesmo por ter deixado Sita desprotegida.

Conquanto esse seja o padrão, exceções são encontradas. O próprio Senhor Krsna aceitou e Se casou com 16.000 princesas que haviam sido raptadas por Bhaumasura; embora, socialmente, elas talvez fossem ser consideradas impuras e, portanto, ninguém se casaria com elas; elas foram completamente purificadas em virtude da devoção. Draupadi foi submetida pelos Kauravas a um assédio impensável, mas foi protegida pessoalmente pelo Senhor Krsna, e, posteriormente, vingada por seus esposos, e certamente não havia na mente de ninguém alguma dúvida quanto à pureza dela.

Há também a história de Ahalya, que foi ludibriada por Indra e amaldiçoada por seu esposo a se tornar uma pedra; ela, posteriormente, porém, foi purificada de toda contaminação entrando em contato com o Senhor Rama e se uniu novamente ao seu esposo. Apenas alguns exemplos.
No que tange a Mãe Sita, Ela é definitivamente acima de qualquer reprovação.


O fato de o Senhor Rama submetê-lA ao teste do fogo, como você já colocou, tinha a finalidade de estabelecer a força da pureza dEla ante o público geral, o que Ele fez no papel de um rei ideal. E a angústia de Ramadasa Vipra não se dava em conseqüência da consideração de Mãe Sita possivelmente ter sido poluída, mas em virtude dEla ter sido tocada pelo maligno Ravana contra a Sua vontade.